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O Que Eu Não Sei De Mim - Conto Erótico Lésbico

Atualizado: há 1 dia


Conteúdo adulto. Também disponível na Amazon Kindle Unlimited.

Registro Copyright - 2019 | Biblioteca Nacional - 2019 | Autora Larissa Braz.


Parte um



Lara


Lara estava de pé em meio ao cômodo vazio onde antes era sua sala, mais ou menos trinta minutos. Nas mãos ela segurava forte as chaves do apartamento que um dia fora seu lar. Ali, naquele lugar, ela viveu momentos memoráveis com os amigos, os pais e Alex, seu ex-namorado.


Ah, o Alex... Os dois haviam se separado fazia pouco mais de um mês. Como pode acabar um relacionamento de seis anos, assim, do nada? A resposta era uma só. Lara não o amava mais. Vários fatores contribuíram para aquilo, incluindo o seu jeito imaturo de ser. Sempre correndo para a barra da saia da mãe e tratando-a como segunda opção. Um dia ela se cansou. Acordou e percebeu que de fato o que a impedia de deixá-lo não era amor e sim medo de ficar sozinha.


“Mas para que o medo, garota? Você não é autossuficiente?”, se perguntou por dias antes tomar a decisão final.


Lara estava prestes a inteirar vinte e sete anos, e ela desejava estar casada antes dos trinta. Filhos? Talvez, quem sabe. Ela nunca havia pensado nisso. Mas como poderia ela se casar com alguém como Alex? Ela viveria uma vida infeliz e logo mais perceberia que não havia outra escapatória daquela infelicidade que não fosse o divórcio.


Então, em uma conversa adulta por sua parte, onde ela o assistiu chorar, interrompeu o namoro de longos anos. Havia chegado a hora de cada um seguir o seu caminho e era exatamente isso que Lara estava fazendo; seguindo.


Quando surgiu a chance de disputar por um cargo na empresa farmacêutica onde trabalhava há sete anos, ela lutou com unhas e dentes para consegui-lo. Até perdeu a amizade de um colega que não aceitou perder a oportunidade para uma mulher. Mas que falta aquele sujeito iria fazer na sua vida, afinal? Eu respondo. Nenhuma!


Mas, com a nova função, não, vinha somente o aumento do salário. Lara também teria que se mudar de estado. Sem filhos ou até mesmo um passarinho para dar de comer, ela não pensou duas vezes. Vendeu todos os móveis, alugou o seu apartamento – presente do pai coronel do Exército Brasileiro – e arrumou as suas malas rumo a Belo Horizonte, Minas Gerais. E foi bem ali, no centro do estado mineiro, que ela viu o seu mundo virar de pernas para o ar. Lara só sabia se fazer uma única pergunta: “Como poderia sentir aquelas coisas jamais sentidas, ainda mais por outra mulher?”


***


Giulia


Giulia esperava pelos advogados de Morgana há mais de vinte minutos. Os seus advogados eram tão descompromissados como a cliente, sua ex-esposa. Depois de nove meses separadas, enfim, iriam se libertar de vez.


A separação não foi fácil, houve muita dor. Principalmente da parte de Giulia que a amava intensamente. Quando Morgana partiu para África, deixando-a para trás de coração partido, Giulia fez uma promessa para si mesma. Nunca mais iria se apaixonar de novo, ou muito menos amar.


Ela era uma médica pediatra bem-sucedida. Tinha a agenda cheia para mais de meses. Bonita. Loira. Trinta e cinco anos de pura elegância e sabedoria. Apesar de ser filha única sem pais desde os dezessete, Giulia não era uma pessoa pacata ou solitária como quem não a conhecia poderia imaginar. Ela tinha amigos. Dezenas de amigos que não a deixaram cair na fossa profunda do pós-término.


Os meses seguintes após o fim do casamento foi passando e as coisas foram fluindo bem para ela. Saia para balada quase todos as noites de quinta a domingo. Beijava várias mulheres bonitas e levava quase todas para casa, mas nenhuma delas conseguia entrar no seu coração por mais que tentassem. Os amigos apelidaram carinhosamente o seu coração de pedrinha de gelo.

Porém, mal sabia ela que isso estava prestes a mudar após uma noite de sexo com uma paulistana recém-chegada na cidade, que ainda nem sequer sabia o que ou quem era.


***


Parte dois



Depois que chegou a Belo Horizonte, Lara não teve muito tempo para parar e pensar no que havia deixado para trás. Mais do que nunca, ela estava ocupada com a nova fase no emprego.


No seu novo apartamento, caixas ainda lacradas com os seus pertences estavam espalhadas por toda parte. Aquilo estava uma verdadeira bagunça. Todos os dias, enquanto bebia a sua caneca de café pela manhã, ela dizia para si mesma que precisava dar um jeito naquilo. Afinal, já fazia um mês que havia se mudado e em algum momento teria de terminar de organizar a sua mudança. Os móveis foram montados na primeira semana, então, essa não era a desculpa para a desorganização.


No trabalho, ela estava sempre correndo de um hospital ao outro, visitando clínicas e atendendo aos clientes mais antigos da Gayer Farmacêutica. O novo inibidor de apetite estava sendo sucesso no mercado. Embora não concordasse com o uso, era ele que estava pagando as suas contas.


Mal tinha trinta dias que ocupava o novo cargo e Lara já era a funcionária do mês. A menina era comunicativa, sorridente, simpática, além de bonita, é claro. Fazia amigos fácil, fácil. E com o passar dos meses vindos, já tinha vários deles. Não havia um barzinho sequer na cidade que ela ainda não tivesse conhecido.


Lara havia mesmo era se apegado a Fernando, um médico ortopedista do Hospital de Santa Rita. Em meio um bate-papo na recepção do hospital, ela descobriu que havia cursado faculdade de comunicação com a prima dele em São Paulo, de onde veio.


Os dois haviam se tornado rapidamente unha e carne. Para ela, ele era somente um bom amigo que a ajudou no seu novo lar. Mas para Fernando, Lara estava se tornando mais que uma amiga. Pelo menos na sua mente.


Depois de um dia cansativo de trabalho, Santa Rita seria sua última parada de visitação. Lá, após atender aos dois médicos que foi ver, encontrou Fernando na lanchonete para um café.


— Acho que você precisa mesmo é de uma cerveja — disse ele.


— Mas hoje ainda é quinta.


— E daí? Vamos. Eu pago.


Sozinhos, cada um no seu carro, seguiram até um Pub ali perto. Ambos se encostaram no balcão e começaram a beber. Logo chegou Gabriela, a enfermeira de quem os dois eram amigos. Rapidamente ela se juntou a eles.


Os três optaram por sentarem em uma das mesas ao canto e longe da música alta para que pudessem conversar, enquanto bebiam mais algumas cervejas. Papo vai, papo vem, o relógio no seu pulso já marcava onze e meia da noite. Era hora de ir para casa.


— Olha! É a Dra. Giulia — disse Gabriela.


Fernando olhou para onde ela apontava discretamente e acenou para médica loira que veio ao encontra deles.


— Olá, doutora. Perdida por aqui? — perguntou Fernando, sorridente.


— Sete horas em uma sala de cirurgia. Estou precisando de uma cerveja para relaxar antes de ir para casa — disse ela, sorrindo, e só depois dirigiu o seu olhar para Lara.


— Essa é a Lara, nossa amiga. Lara, essa é a Giulia. Uma das pediatras do hospital. — Fernando apresentou-as.


— Oi. Acho que já te vi andando pelos corredores.


— Prazer em conhecê-la. — Lara apertou a sua mão e sentiu um leve formigamento na palma.


“O que foi isso?”, se perguntou.


O olhar de Giulia era intenso. Mesmo com a pouca luz no ambiente, ela conseguiu observar a cor da íris dos seus olhos. Eram verdes! Belos olhos verdes.


— Esperando alguém? — perguntou Gabriela para Giulia.


— Não.


— Sente-se conosco — convidou Fernando.


Giulia sorriu para Lara e sentou ao seu lado no banco, de frente para Fernando e Grabriela.

— Mais quatro cervejas, por favor — pediu ele ao garçom.


— Então, Lara... Você trabalha na Gayer, não é? — perguntou Giulia, puxando assunto com ela, que se sentia estranhamente nervosa ao seu lado.


— Sim. Há sete anos.


— Mas você não é daqui. Deixe-me adivinhar... — Estreitou os olhos e encarou-a fazendo Lara sorrir um tanto envergonhada. — São Paulo?


— Sim. O meu sotaque é tão forte assim?


— Um pouco.


— Preciso ir ao banheiro — anunciou Gabriela, saindo da mesa.


— Já que você desobstruiu a passagem, eu vou aproveitar para ir também. Já volto, meninas — disse Fernando, levantando-se e piscando para Lara com galanteio.


— Ele está a fim de você — disse Giulia assim que ambos se afastaram.


— O quê? Não! Somos só amigos.

Giulia riu e deu um gole na sua cerveja.


— Pode até ser para você, mas não para ele. Eu percebi o jeito que te olha rapidinho e nervoso para não ser pego no flagra.


— Não estou em busca de relacionamento, acabei de sair de um bastante complicado há pouco mais de cinco meses.


— É mesmo? Eu também. Assinei meu divórcio há alguns dias.


— Imagino que tenha sido difícil. Eu namorava há seis anos e foi complicado romper.


— No meu caso foi ao contrário, mas isso não tornou menos difícil. Eu ainda amava ela. Amava muito. — Abaixou a cabeça.


“Ela?”, Lara ficou curiosa e em alerta.


— Se importa se eu perguntar o que aconteceu?


— Não. Na verdade, a história é simples. Ela foi convidada a trabalhar no MSF na África e foi embora.


— Mas eu sei que quando se é casado pode levar a família. Além de que você seria muito útil lá. É pediatra.


— Sim, mas ela se virou para mim e disse querer seguir essa nova jornada sozinha. — Olhou para Lara e sorriu triste.


— Eu sinto muito.


— Não sinta, já passou. Oito anos jogados no lixo. — Negou com a cabeça decepcionada, recordando do dia em que Morgana partiu.


— Mas a vida continua.


— Sim. — Sorriu novamente para Lara, mas, desta vez, sem tristeza e olhando-a nos olhos.


Ela a beijaria ali mesmo se pudesse. Estava sentindo uma atração esquisita, como se Lara fosse o imã e ela o metal. Lara era linda e tinha um jeitinho meigo e simpático de ser que chamou a sua atenção. Os seus lábios eram tão desenhados e carnudos...


Que gosto será que tem?”, Giulia se perguntou.


Elas ficaram presas no olhar uma da outra de forma estranha. Aquilo assustava Lara cada segundo que se passava. Por que ela estava olhando daquele jeito para uma mulher? Por que parecia estar hipnotizada pelos olhos verdes que ela não conseguia parar de imaginar como deviam ser na claridade do sol? Isso não estava certo. Não era certo!


— Voltamos! — anunciou Gabriela vindo com Fernando no seu encalço.


As duas desprenderam os olhos rapidamente. Ambas se sentiam confusas, mas Lara se sentia muito envergonhada.


Giulia não costumava se sentir assim pelos casinhos de apenas uma noite. Não que Lara seria naquele dia. O clima tenso e excitante que estava rolando para ela era novidade. Geralmente o desejo que sentia pela garota da vez era apenas carnal. Mas, agora, parecia ser tão espiritual.


— Eu tenho que ir. Já está tarde e trabalho amanhã — disse Lara, pegando uma nota de cinquenta reais na carteira.

— Mas já? Isso não é desculpa, todos nós trabalhamos amanhã — falou Fernando desapontado.

— Eu também já vou. Te acompanho até lá fora — disse Giulia e virou o resto da cerveja em um só gole.


— Tudo bem.


Giulia se levantou e Lara fez o mesmo em seguida. Elas se despediram dos amigos e seguiram para fora do bar.

— Esse é o meu carro — avisou Lara quando chegou ao seu veículo parado no estacionamento.


— Certo. O meu está lá na frente.


Giulia se aproximou e beijou o seu rosto com um beijo demorado, sentindo a macies da pele de Lara e o seu perfume floral suave.


— Boa noite. Nos vemos por aí — disse ela baixinho, ainda com os seus rostos próximos.


— Tchau.


Giulia seguiu pelo estacionamento e Lara ficou ali, de pé, a vendo partir. Ela levou a mão até o rosto onde fora beijada e sentiu o mesmo leve formigar que havia sentido mais cedo na palma da mão. Respirando fundo, ela entrou no carro.


O que é isso que estou sentindo?”, se perguntava.


Lara não entendia o porquê se sentia daquele modo tão estranho, nunca sentido. Estava confusa, muito confusa.


***


Parte três